terça-feira, 19 de maio de 2009

Singularmente ás escuras

Uma vez vimos um filme porque tinha marcado alguém. Tinha tido um significado especial para esse alguém e tinha feito esse alguém pensar. Vimo-lo porque não acreditámos, e porque queríamos provar, a nós próprios, de uma forma sádica, que nada nos marca, que somos fortes e intocáveis. Um pouco como a frase “homem que é homem”, mas no plural… e no imaginário.
Vimo-lo, não nos afectou, mas não o provámos. É óbvio que não ficou provado porque não há nada para provar. É das poucas coisas que é falso, só e apenas, pelo facto de ser masculino.
Não nos afectou mas fez-nos perceber, naquele instante, por coincidência, pelo alinhamento dos astros ou pela Sininho estar a passar nesse momento e ter espirrado um pouco de pó mágico (é mesmo uma fantasia e não uma metáfora para droga), que há certos acontecimentos que não fazem qualquer sentido às escuras. Acrescentamos: singularmente às escuras, para assim eliminar o sexo do pensamento como um acontecimento que faz, ou pode fazer, várias vezes, sentido... ás escuras.
É sempre difícil, para mim, escrever com tantos a falarem ao mesmo tempo, por isso, divago e peço desde já as nossas desculpas para o futuro.
Um acontecimento singularmente ás escuras, será algo equiparado a andar numa montanha russa de olhos fechados. Que não é um bom exemplo porque há quem não goste de montanhas russas e isso seria mais ou menos óbvio (o fechar dos olhos). Será então algo como, comer morangos sem paladar (toda a gente adora morangos!). Como chegar à Antárctida ás três da tarde em plena aurora boreal mas ser cego. Ouvir Keith Jarret ao vivo no seu melhor concerto para piano, sendo surdo. Poder voar mas só inconsciente. Andar de mão dada, com as suas mãos. Dar um abraço a si próprio. Beijar o lábio de cima com o de baixo.
Um acontecimento singular: Único. A solo. Solitário. Isolado. Escondido. Desamparado.
Ás escuras: Negro. Preto. Escuro. De olhos fechados. Surdo. Cego. Solitário.
Inicialmente pensámos que há certas coisas que não fazem sentido às escuras. Após reflexão, sabemos que não nada que faça sentido singularmente às escuras.
Encontrámos uma lanterna. Mas tem pilhas especiais. Vai dando luz e vai nos dando a mão. Só não dá é abraços…

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