terça-feira, 14 de junho de 2011

já não estou aqui



O medo adulto não é, muitas das vezes, mais do que o cansaço num desconhecimento. E é isso que esta viagem é: medo. Medo e bom e saudade e, sobretudo, desconhecimento. É não dormir pelo desconforto de que sonho e sei, num sonho, como é a vida numa remota e desconhecida noturna estação. Não tive a sorte de ter escolhido o sol mas, se a escolha foi minha, não é correcto da minha parte chamar-lhe sorte. Digo antes que não tive a audácia (ou mesmo a coragem) de ter escolhido o sol. Escolhi antes a negra solidão e toda a sua falta de luz.
Há cantos que não ouso chegar perto só pelo cheiro infeto a mijo. Não é a pestilenta urina ácida acumulada nos cantos mais recônditos, é mesmo mijo. No olhar dos residentes deste local, vejo o mesmo cheiro corrompido e caducado em forma de olhos, que me atrevo a desafiar: Não mexe ao encontrar o meu. Bastou um relance, um olhar de um segundo num sentimento inquieto de observação terceira, para numa fração de troca de olhares, eu perder e ser dominado pelos olhos negros. Aqui só vivem estes olhares, em corredores estreitos, espalhados pelo chão que me fazem medir os meus mínimos de limpeza. Apesar de aparentemente invisíveis, de ninguém se importar que os olhos durmam no chão, nas escadas ou nos corredores à média ou quase nenhuma luz, todos passam sem tocar, quebrando o ritmo certo dos passos que ora atrasam para acertar o evitar, ora adiantam para dar um salto e retomar. À medida que as horas passam, o mesmo ritmo dos passos torna-se pouco espesso e, com esta nova densidade, o movimento desaparece. Jogamos agora o jogo da estática. Nas regras, todos temos que ser pobres e, nas peças, todos temos que ter álcool.
Podia ter escolhido o sol, escolhi isto mas, até para mim, isto, está neste momento a ser demais e, aquele aparentemente inóspito e degradante café, agora, parece-me o mais acolhedor dos hotéis.
É aqui que me vou manter escondido até as horas me acordarem de volta e me trouxerem, numa voz de lençóis lavados e pequeno almoço na cama, de volta ao tempo. Neste medo pelo desconhecido, refaço a seguinte métrica: O estado de civilização de um sítio, mede-se não pela resposta à pergunta (que se torna irrelevante) mas pelo simples fato de ser feita a pergunta: se morresse aqui, neste preciso instante, neste mesmo local... que aconteceria ao meu corpo?
Foi não saber responder a esta pergunta que me fez suar frio de medo e pensar: O medo adulto não é, muitas das vezes, mais do que o cansaço num desconhecimento.



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